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A Olivicultura no Brasil – Medalhas x Maturidade da dúvida

Por Gabriel Bertozzi


“A agricultura parece ser muito fácil quando seu arado é um lápis e você está a quilômetros de um milharal.” Dwight D. Eisenhower 


“A dúvida é o melhor caminho para as certezas”. O conceito se pauta na interrogação motivada por intuição e crença. De outro modo, a ideia nos leva a certezas não absolutas que necessariamente geram novas dúvidas e novas certezas, mantendo assim uma dinâmica que nos alimenta com desafios de saberes constantes engendrados por iniciativas que promovem as validações almejadas.




A perspectiva do plantio de oliveiras e produção de azeite no Brasil, olivicultura, após algumas iniciativas que não ganharam força em tempos mais remotos assumiu, há cerca de 20 anos, uma onda intensa que se mostra ascendente. O Brasil conta hoje com uma cadeia constituída de forma integral em linearidade partindo da base do cultivo que, com advento de tecnologias de propagação vegetal, alcançou a difusão por disponibilidade em série de mudas de oliveira com uniformidade e padrão genético para atender à demanda de cultivos comerciais. Vale a informação de que, graças à multiplicação clonal de indivíduos vegetais, a olivicultura ganhou, há não muito tempo, uma dinâmica revolucionária em contexto mundial. Estamos falando de uma olivicultura moderna e voltada para a eficiência, capaz de superar desafios de racionalidade nas operações de cultivo e manejo, mecanização, novas variedades, maiores ofertas de azeite a um mercado cada vez mais educado ao consumo crescente do bom alimento funcional.


Voltando à realidade da cadeia brasileira, tivemos como ponto de partida da nova saga do azeite o diferencial técnico de poder contar com mudas de oliveira advindas de processos modernos. É fato que houve, e ainda se repete, a implantação de pomares com pouca variabilidade de cultivares.


Mas somos o que somos, discutimos o que discutimos e inserimos o Brasil como país produtor, graças ao fator da disponibilidade de mudas.


Na outra ponta, a validação da cadeia se dá por inúmeros azeites nacionais premiados em concursos mundo afora. A difusão foi grande e reverberou favoravelmente a vibração materializada por azeites brasileiros de alta gama.


Também, na extremidade dos resultados, o Brasil atualmente se posiciona bem com uma indústria que produz e já vendeu algumas dezenas de plantas de extração de azeite com maquinário 100% nacional, passando a disputar o mercado global não deixando nada a desejar para as empresas que tradicionalmente operam no segmento. Adicionalmente, registrando e atualizando o panorama vigoroso, temos uma muito bem editada revista especializada em azeites & olivais.


Neste cenário de cadeia constituída, validada nos extremos, estamos diante de um panorama onde se encontra a maturidade da dúvida. Pois a dúvida embrionária que culminava no questionamento inicial do produz ou não produz, evoluiu em respostas positivas abrindo lacuna de caminho para a validação necessária e urgente dos entremeios da cadeia na busca de uma eficiência que vai além do conceito de produção do fruto azeitona e extração de azeites premiados. Há ainda muito a ser explorado na domesticação de um cultivo de caráter comercial, que, pelo grau de difusão já implantado com predominância nos estados do Rio Grande do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Espirito Santo, exige velocidade de ações, união entre técnicos, produtores, governo, instituições. É bastante natural que a introdução de uma cultura exótica ao nosso clima tropical, padeça de equacionamentos em curto prazo. Toda “novidade agrícola” demanda tempo para evoluir e gerar os resultados esperados. Sabemos ainda que, mesmo com dinâmicas positivas em campo, são e serão permanentes os trabalhos de evolução na agricultura em prol da eficiência produtiva e resultados abraçados por cada cadeia em si. Exemplos históricos são observados na cafeicultura, cultura da soja, do trigo, da maçã, etc. Cultivos que ganharam ao longo dos anos novas fronteiras, variedades, melhoramento genético, tecnologias de manejo e fomentos específicos. Em comum aos atos evolutivos desses exemplos estão sobrepostos pesquisa, desenvolvimento econômico, gana pioneira de empreendedores, capacitação de profissionais e a força individual de cada uma dessas cadeias em atuação sinérgica a ponto de gerarem iniciativas cooperadas, políticas especificas bem delineadas, incentivos fiscais, apoios governamentais e interesses privados relevantes. A produção de vinhos no Brasil já se organiza nesse patamar. Não há progresso sem ciência e tecnologia, mas união de forças e integração de interesses comuns são alavancas fundamentais, principalmente quando ainda não existe o instrumental cirúrgico para dissecar um corpo produtivo pulsante e bastante complexo no que tange às variáveis que o manterá vivo e latente.


A olivicultura no Brasil possui a particularidade de trazer uma força ancestral curiosa, enraizada nos encantos de uma árvore mística, produtora de um alimento de nobreza indescritível. Muito do que se tem em campo hoje é fruto de um desejo sobreposto e vaidoso que perpassou a razão em técnicas e inversões de capital na ânsia de inovação. Fazer azeite no Brasil foi, em princípio, muito mais do que o desejo de implementar uma atividade economicamente positiva, traçada por planos de negócio e viabilidade. Incomparavelmente a olivicultura despertou nuances e requinte do ineditismo, incitando o risco em detrimento do status.


Notadamente, alguns atores vieram com racionalidade e visão estratégica, mas não podemos descartar a pitada exagerada e destemida do ingrediente orgulhoso que destemperou a base funcional que veio invariavelmente acompanhada do desconhecimento técnico de todos que se lançaram no movimento do azeite brasileiro em inexplicável e generalizado “feitiço” pela atividade.


A expressão e ponto atual do estágio da cadeia “Maturidade da dúvida “, é percepção e reconhecimento de um momento em que parece haver uma unanimidade de coesão em prol de resultados coletivos. É necessário que estejamos despidos de brios e medalhas para a abertura resignada de auxílio mútuo, desarmado de titulações, hierarquias e grandezas. Somos pequenos diante dos desafios climáticos consubstanciados por uma olea europaea que guarda segredos mutáveis segundo o ponto geográfico a que se submente. A olivicultura mundial enfrenta desafios. No Brasil não é diferente, ainda que poderemos, oportunamente, passar a figurar como novo grande reservatório do azeite. A oliveira caminhou no globo e hoje está presente em 56 países. Talvez o Criador esteja a nos brindar com a perspectiva da bonança do mais rico alimento funcional. Temos tudo para sermos a nova fronteira do ouro líquido. Nos falta a proliferação de uma “Fé” congregada na busca comum. Fé na pesquisa dinâmica, na difusão de informações. Fé no apoio e incentivo das instituições públicas e privadas.


Fé no espírito colaborativo de técnicos e produtores. É necessário garimpar essa Fé transcendente e realizadora, a Fé que suplanta os obstáculos com atitude que impacte e promova ações e resultados efetivos. Essa é uma Fé empreendedora e visionária análoga à força de quem adquiriu lagares imediatamente ao plantio das mudas. É essa Fé que agradará ao Criador. É essa “Fé” que trará eficiência produtiva e romperá fronteiras capazes de socializar o consumo do nobre suco das azeitonas. 


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